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continuum, sonoridades


yuri bruscky sobre o entorno foto: igor marques/ manga rosa

o continuum, festival de arte e tecnologia do recife, teve a privacidade como tema de sua edição de 2016. o evento se dividiu em duas partes: na torre malakoff, exposições e mostras de vídeos e games. ali perto, na roda cultural, a mostra sonoridades, com dois dias de shows, desta vez apenas com artistas pernambucanos: grilowsky e binário (no primeiro dia) e yuri bruscky e hrönir (no segundo).

diferente dos trabalhos em exposição na malakoff, os artistas do sonoridades ficaram mais soltos em relação à temática, podendo ou não trabalhar em torno dela. grilowsky e yuri optaram por seguir a proposta. grilo apresentou uma performance construída a partir de áudios de whatsapp enviados pelo público, enquanto yuri criou a peça variações (sobre besouros, caixas e entornos), utilizando-se de técnicas de síntese com gravações de campo e manipulação de seus sintetizadores modulares.

em texto de introdução sobre a performance, grilo escreve: "a privacidade se escancarou, abriu as portas e as pernas da percepção e se mostra de olhos fechados. redes antissociais, grupos de família no uatizapi, selfie do outro, olho mágico sem poder, câmeras de insegurança institucional, gps patrulha, milícia armada e playboys no poder". entre os áudios, havia barulhos esquisitos, riff de violão (enviado pelo compositor juliano holanda), mensagens banais ou discussões profundas sobre o sentido da arte e afins. é interessante perceber esses pequenos áudios como um misto de fotografia, deslocado no tempo e espaço, e como um carta, com seus resíduos de afetos. e como tudo isso pode ser ressignificado em diferentes abordagens e contextos. as pequenas histórias dos outros e de nós que existem naqueles áudios.

ainda que fora do ruído e mais próximo do emotivo (ou sentimentalismo mesmo), o mineiro jonathan tadeu e os pernambucanos da namoa também tocam nessa questão, respectivamente, nas músicas martini e somente sua música falhará e assim você virará cinzas sobre a terra.

yuri bruscky abordou o tema de uma maneira menos material e não objetiva, pensando na criação de uma paisagem sonora imersiva. o título, variações (sobre besouros, caixas e entornos), é uma referência ao argumento da "linguagem privada", de wittgenstein. yuri comentou que a proposta é: "abordar a privacidade no sentido de uma instância subjetiva e intersubjetiva, de interioridade e exterioridade e que no fim das contas é a relação do eu com o outro. para mim, isso é muito significativo do que é estar numa paisagem aural e de uma relação com os sons ao nosso entorno". são estruturas erguidas em sequência lenta e minuciosa, com transições acentuando uma narrativa, ainda que meio dissolvida. o vídeo não capta bem a riqueza de texturas envolvidas ali, mas o áudio foi gravado e deve ser lançado (logo, espero).

por trás da cortina, o hrönir (em versão duo com thelmo cristovam e túlio falcão) tocou anagrama, peça eletroacústica de bardo thödol (liberação por audição no plano post mortem), seu primeiro disco, lançado em 2004. mesmo sem um trabalho diretamente ligado ao tema, acabou-se dialogando muito com a proposta de yuri -- uma imersão num espaço de sons de fonte desconhecida, embaralhamentos da percepção, em conjunto com a busca por potencializar a escuta para além da ordem auditiva, daquilo que está ao ouvido.

infelizmente não pude ver o show do binário, projeto de h.d. mabuse (membro do extinto coletivo digital re:combo) com queops negronski e igor holanda. a ideia é interessante: tecer misturas entre noise, construções rítmicas das ruas e música pop.

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